quarta-feira, 10 de novembro de 2010

deu no AGUARRÁS, por ELVIRA VIGNA


37 – 08/10/2010
SAMIR ABUJAMRA E ALESSANDRA COLASANTI (publicado pelo Aguarrás sob o título de “A bailarina de vermelho”)
Em meu texto Histórias da arte, tenho um capítulo seriíssimo dedicado à arte contemporânea. Me deu vontade de substitui-lo por um link. É que o vídeo A bailarina de vermelho, de Samir Abujamra e Alessandra Colasanti, é meio tudo que eu queria dizer a respeito. A começar com a frase de apresentação da Bailarina: “É que eu não me considero eu, entende?”
A história, ahn, ok, o fio, é simples. Em um dos quadros de Degas, há uma cadeira vazia. Depois de vários takes de depoimentos, dados históricos e documentos visuais – incluindo fotos antigas, filmes mudos e vídeos do youtube – ficamos sabendo que a bailarina sumida, assim como a arte contemporânea, está em todos os lugares.
E está, principalmente, na auto-ironia dos nés e entendes de fins de frase. E na legenda com a tradução errada de um “filme mudo”. Ou no suposto programa de Michel Melamed, com um vagabundo entrando em cena, atrás. Na explicação acadêmica de Jards Macalé sobre a origem bailarinesca dos nossos quatro dias de carnaval. Na própria cara torta da atriz. E na sua voz arrastada de quem acaba de cheirar/tomar/fumar todas. E na sua mãozinha que indica que aspas acabam de ser abertas ou fechadas em citações (falsas) de Lacan.
Exemplo de uma citação de Lacan: “Quem sabe faz a hora.” Terminada, claro, com um né.
A Bailarina namorou Picasso. Que é um exemplo, segundo ela, da disparidade eventual que se pode notar entre significado e significante. Um, hiperbólico. O outro, a coisa em si, liliputiano.
Ah, e ela acha que a contextualização de seus procedimentos artísticos se dá a partir do advento da morte do autor. Entende?
(E também se dá no desbunde anti-revolucionário e revolucionário pós-64; na derrubada do World Trade Center; em John Cage – que lhe dedicou uma de suas composições; na arte performática de Beuys; no movimento funk norte-americano; e mais em uma meia dúzia de coisas que não deu tempo de tomar nota. Ok?)
Suas origens conceituais vêm de Gertrude Stein, Andy Warhol, body painting e o balé russo. Né?
O vídeo, de 15 minutos, segue o rastro de tal figura, no ano sabático em que ela some no mundo. Um Laos, Nigéria, Criméia e outros lugares abstrusos, todos filmados em Paris, Nova Iorque e Rio. O vídeo e a Bailarina repetem, caçoando, o linguajar culto, erudito da crítica de arte. Não é só a arte e suas manifestações que são retomadas de forma escrachada. O que, em si, já é uma crítica, e das mais eficazes. O fazer crítico também é ironizado e, desse modo, destruído.
Não é que o vídeo não fale de questões importantes. Fala sim. Mas fala rindo.
Por exemplo, o fim, com os créditos, é um take de um músico de metrô americano. O vídeo acaba com uma música, essa arte que some assim que termina. Sem deixar material algum para ser jogado no lixo. Cujo emissor não é sequer visto. As pessoas, de costas para o músico que está sendo filmado, esperam um trem. O barulho do trem entra na música. Não há distinção entre música e trilha sonora do cotidiano. Assim como não há diferença rígida entre vermelhos. Ou entre fruições estéticas ou apenas sensoriais. E isso não é um drama.
Falei acima das “origens conceituais” da Bailarina. Uma que não é citada é a de Stanislaw Ponte Preta e seu Samba do Crioulo Doido. Carnaval – e se você quiser manter a clave do erudito-cafona, posso teclar aqui um Bakhtin para gáudio do populacho. Carnaval. E Brasil. Total atualidade. É sério. E você está aí, rindo.
Direção: Alessandra Colasanti, Samir Abujamra
Roteiro: Alessandra Colassanti, Samir Abujamra
Elenco: Alessandra Colasanti, Cora Ronai, Cissa Guimarães, Enrique Diaz, Marina Colasanti, Affonso Romano de Sant’Anna, Vera Holtz, Michel Melamed.
Fotografia: Samir Abujamra
Montagem: Samir Abujamra
Música: Lucas Marcier.
País: Brasil
Ano: 2010
Duração: 15min

Um comentário:

Unknown disse...

Alessandra,
Ficamos muito felizes que vc tenha gostado da crítica da Elvira. Será que você pode, por favor, colocar um link para o artigo ou para o Aguarrás? Isso nos ajuda bastante, por mais bobo que possa parecer.
Forte abraço,
Carolina (editora do Aguarrás)